No
último domingo, enquanto passava por uma avenida localizada no subúrbio de
Fortaleza, me deparei com algo bastante interessante. Bonecos de pano tinham
sido postos em cadeiras, vestidos como diversas figuras públicas ou anônimas.
Enquanto o carro transitava pela via, pude ver cerca de oito bonecos e no final
da calçada onde eles estavam expostos, uma propaganda escrita em um papelão
rasgado, com tinta azul e letras trêmulas: Zé dos Judas. O telefone para
contato estava logo abaixo. Este são produtos em alta para quem quer se
preparar para o próximo feriado.
Para
quem não conhece e não entende o que estou falando, explico brevemente. O
feriado da Semana Santa simboliza a Paixão, Morte e Ressureição de Cristo. O
período que representa a chegada de Jesus a Jerusalém, seguida de sua morte,
que ocorre graças à traição de Judas, um de seus doze apóstolos. Em troca da
cabeça de seu líder, o homem receber 30 moedas dos sacerdotes e capitães que o
subornaram. A parábola cristã apresenta como desfecho a ressureição do filho de
Deus.
Voltemos
aos bonecos. Chama bastante atenção o processo civilizatório e as formas de
simbolização que nossa sociedade adquiriu com o passar do tempo. Uma vez ao ano
um boneco é queimado para simbolizar a traição feita contra o maior símbolo da
fé cristã. Jesus Cristo. É essa a representação dada aos bonecos de Judas que
são vendidos nas calçadas do subúrbio fortalezense. Li em uma matéria de jornal
que os bonecos podem representar preconceito, racismo, homofobia e tudo aquilo
que deve ser expurgado de uma sociedade que busca justiça e igualdade àqueles
que a compõe.
Dos
oito bonecos que contei, um me chamou bastante atenção. Ele era o terceiro e
estava repousado em uma cadeira de plástico branca. Nos poucos segundos que o
vi, percebi o motivo de ele ter se destacado à minha visão. Seu rosto era feio,
assim como os dos outros. Feito de um material que parecia isopor quebrado.
Talvez o artista que o produziu estivesse cortando gastos. Suas sobrancelhas,
boca e nariz foram pintados com tinta guache de forma bastante grosseira, nas
cores preto e vermelho.
Sua
vestimenta era igual a dos outros bonecos, feita com roupas velhas, rasgadas e
desbotadas, no entanto um único adereço chamou a atenção e é nele que se
concentra tudo. Do alto de um dos seus ombros até a sua anca do lado oposto
havia uma faixa que riscava seu tronco. Duas cores compunham a faixa. Ela era
metade amarela e metade verde. Percebi então que o boneco representava o presidente da república Michel Temer.
Simples, previsível, vulgar e genial.
A história bíblica diz que no momento de sua traição Judas havia
sido possesso pelo demônio. Interpretamos, portanto, que a atitude do apóstolo
foi passional, chegando até a não ser de sua responsabilidade, afinal ele
estava sob o efeito do próprio Satanás.
Michel, no entanto, faz parte de um plano muito bem arquitetado,
planejado minuciosamente para destituir uma líder de seu posto. O usurpador é
visto por muitos como o próprio demônio encarnado. Um demônio corrupto odiado
pelo próprio país.
Qual país odiaria o seu próprio presidente? Um país que não o
escolheu como tal.
Quantas moedas teriam sido suficiente para seduzir Temer em
suas escolhas?
Quando a ordem simbólica deve ser posta em prática na queima
de bonecos e quando a (des)ordem política e social deve ser acionada para
destituir um corrupto de um lugar que não lhe pertence?
Devemos Temer o Judas?
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